Gratuidade da justiça e a reforma trabalhista

A gratuidade da justiça é o benefício concedido à parte que não possui condições de arcar com as despesas processuais, como custas, honorários de perito, honorários de sucumbência. Inicialmente regulado pela Lei 1060/50, cujo artigo 9º assim dispõe: “Art. 9º. Os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos do processo até decisão final do litígio, em todas as instâncias”.

A Lei 13.467/2017 alterou mais de cem artigos da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, regulamentando, inclusive, a gratuidade da justiça, ponto de grande descontentamento entre os operadores do Direito, assim como tantos outros pontos polêmicos trazidos na reforma.

Disposto nos parágrafos 3º e 4º do art. 790 da CLT, o benefício da gratuidade da justiça será concedido a quem comprovar insuficiência de recursos para pagamento das custas, sendo facultado aos julgadores, em qualquer instância, podendo ser a requerimento da parte ou não, conceder o benefício àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, o que perfaz, atualmente, o valor de R$ 2.258,32 (dois mil duzentos e cinquenta e oito reais e trinta e dois centavos). Aqui temos uma das mudanças trazidas pela nova legislação, visto que a lei definiu o que é “insuficiência de recursos”, o que, num primeiro momento, nos faz crer que não há margem para discussão acerca da renda do requerente.

Contudo, o ponto de maior crítica diz com o parágrafo 4º do art. 791 – A da CLT, pois permite que, mesmo beneficiário da gratuidade da justiça, a parte que for sucumbente, ou seja, se perder algum pedido feito ou não obter êxito em perícia, suportará tais despesas com os créditos da própria demanda ou em outro processo que tenha valores a receber.

De fato, a isenção só ocorrerá se a parte sucumbente não receber nenhum crédito nessa demanda ou em outro processo. Ocasião em que as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos seguintes do término do processo, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade; não havendo tal comprovação, passado esse prazo, extinguem-se tais obrigações do beneficiário.

Portanto, mesmo beneficiário da gratuidade da justiça, caso perca algum pedido ou não obtenha êxito na perícia, a parte poderá ter de pagar os honorários para o advogado da parte contrária (sucumbência) ou os honorários do perito, sendo descontado direto do valor que receberá do processo, podendo, inclusive, ser descontado em valores que tenha para receber em outro processo. A crítica se sustenta exatamente na desconfiguração do benefício da gratuidade quando o beneficiário é obrigado a pagar tais despesas.Tal situação, ou mesmo a falta de informação clara a respeito da gratuidade, tem trazido insegurança, principalmente ao reclamante que teme a condenação ao pagamento de honorários para o advogado da parte contrária ou mesmo honorários de perito, fazendo com que deixe de ajuizar a demanda ou mesmo de fazer determinado pedido, o qual entende ter direito, mas não a certeza da comprovação.

Por outro lado, há um ponto positivo na norma, e talvez tenha sido essa a intenção do legislador, afastar as aventuras jurídicas, os pedidos sem fundamento, o velho hábito do “vamos pedir tudo” sem um cuidado maior com a realidade dos fatos, sem a devida análise quanto à existência do direito do reclamante. Assim, a nova legislação vem impondo, de certa forma, mudanças importantes na Justiça do Trabalho, cabendo destacar que se trata de uma justiça especializada, criada para proteger o hipossuficiente, mas que vem sofrendo abusos por aqueles que deveriam ser protegidos.

Karina Carvalho Bernardes – OAB/RS 78.946 – Sócia do Bernardes & Prati Advogados