O adeus à voz “mais gremista do Rio Grande”

Após 20 anos de sua histórica entrevista a O Jornalecão, Paulo Sant’Ana se despede como um dos mais polêmicos e respeitados comunicadores gaúchos

 

Poucas semanas antes de sua histórica entrevista a O Jornalecão completar 20 anos, o comunicador Paulo Sant’Ana dá seu adeus, deixando uma marca no jornalismo gaúcho, após décadas de exposição de sua polêmica opinião em jornal, rádio, televisão… 

Na edição de Agosto/2017 de O Jornalecão, que circulará em cerca de 40 dias, estava prevista a reprodução de parte da entrevista que Sant’Ana concedeu ao jornal de bairro mais antigo da Zona Sul de Porto Alegre, mas que, naquele ano de 1997, apenas começava sua trajetória para se consolidar como porta-voz da região. Em função de sua partida, a homenagem teve de ser antecipada.

Confira, a seguir, trechos da entrevista exclusiva concedida por Paulo Sant’Ana ao então estudante de jornalismo Gustavo Cruz da Silveira, em agosto de 1997. As fotos são de Ricardo Duarte. 

 

A voz mais gremista do Rio Grande

“Eu me tornei gremista por hereditariedade”

 

Paulo Sant’Ana é um daqueles cronistas que marcaram sua passagem na história. Polêmico e apaixonado pelo que faz, é protagonista de lances incríveis que, seguidamente, emocionam milhares de pessoas, acertando na veia, demonstrando ser uma das mentes mais privilegiadas da imprensa gaúcha, enumerando várias atividades, e se notabilizando como cronista, lançando grandes polêmicas, muitas vezes, levando ao riso ou à lágrimas.

 

Paulo Sant'Anna no programa Sala de Redação em 1997 - Foto Ricardo Duarte-Arquivo O Jornalecão

 

O Jornalecão: Como um homem que veio das classes menos favorecidas da sociedade, e teve a oportunidade de falar todos os dias com os gaúchos, se sente emocionando o Rio Grande há tantos anos, muitas vezes, fazendo as pessoas chorarem?

Paulo Sant’Ana: Ah, isto é a melhor coisa que existe na minha profissão: fazer as pessoas chorarem ou rirem. Uma das grandes emoções da minha carreira é quando as pessoas telefonam, as multidões, dizendo que choraram com a coluna que eu fiz, sobre o Dia das Mães ou o Dia dos Pais. Se emocionaram, foram às lágrimas. Isto é muito bonito. É uma alegria, É realmente, pra mim, um sonho, ter me transformado, de um inspetor de polícia que era, num comunicador com os canhões mais potentes da RBS à disposição (o rádio, o jornal e a televisão). É realmente um fato marcante da minha vida. É a coisa mais importante da minha existência ter me tornado um cronista muito conhecido.

 

O Jornalecão: Escrever diariamente uma coluna… Como defines o assunto que vai ser abordado?

Paulo Sant’Ana: Chega a nos angustiar. Uma das coisas mais difíceis que existem é achar o assunto. Não tem nada pior do que isso. A maioria das vezes, eu me desespero, porque chega a hora de baixar a coluna, a hora do baixamento do jornal, e eu não penso. Isto que eu tenho quatro espaços por dia, e todos os dias estou com o mesmo problema: a falta de assunto.

 

O Jornalecão: Sant’Ana, por que o Grêmio?

Paulo Sant’Ana: O Grêmio por causa do meu pai. A gente “sempre” é gremista ou colorado por causa do pai da gente: 99% dos gremistas e colorados o são por causa do pai. Eu era garoto e meu pai, que era gremista, me levava aos jogos de futebol e eu me tornei gremista por hereditariedade.

 

O Jornalecão: A grande maioria da imprensa esportiva gaúcha omite seu time do coração. O que o fez abrir sua paixão pelo Grêmio, ao contrário do que se faz normalmente?

Paulo Sant’Ana: É que, quando eu comecei no jornalismo, foi por acaso. Eu fui chamado para dentro do estúdio para bater papo, no Sala de Redação, com o Cândido Norberto, e eu disse que era gremista, porque não era cronista. Eu era uma pessoa do povo que estava sendo entrevistada. Aí eu fiz um sucesso extraordinário nos primeiros dias. Ia lá de vez em quando, no programa, sem compromisso e sem salário, sem nada… Até que eu já estava sendo uma pessoa muito conhecida no Rio Grande do Sul por aquela minha participação, que era como torcedor. Aí me contrataram. E eu continuei torcedor como profissional, como jornalista. Foi, realmente, a quebra de um tabu na imprensa do Estado, porque, desde os primórdios da imprensa, os jornalistas não declinavam o clube do seu coração, como a maioria ainda faz hoje. 

E eu, então, surgi como o primeiro jornalista esportivo que diz para que clube torcia, que defendia seu clube, e isto acarretou a criação de trabalho novo, porque, como a minha voz era muita forte e eu era gremista demais, em rádio, jornal e televisão era preciso contratar pessoas que contrapusessem a minha índole gremista, pelo lado do Internacional. Então, foram criados empregos para pessoas que equilibravam a paixão Gre-Nal, porque, antes, era só eu falando, e os colorados diziam que a rádio era muito gremista. Então, contrataram o Ibsen Pinheiro, o Hugo Amorim, o Cid Pinheiro Cabral, o Cláudio Cabral, o Kenny Braga. Todos eles foram empregos que eu criei com este meu pioneirismo de ter dito qual era o clube do meu coração na imprensa. Eu sei, eu tenho certeza que estas pessoas não se zangam com isto que eu digo.

 

O Jornalecão: O que o fez vestir em público a camisa do Internacional e qual foi a sensação?

Paulo Sant’Ana: Foi uma espécie de brincadeira que o Lasier Martins me impingiu no Jornal do Almoço e eu vesti a camisa do Internacional como motivo de audiência. Eu quero que cresça a audiência do programa em que eu trabalho. Eu vestindo a camisa do Internacional era um fato inusitado e chamou a atenção das pessoas. Cresceu a audiência de tal forma que até O Jornalecão está me fazendo esta pergunta.