Para além da beleza da Renda de Bilros: os bastidores do artesanato nas Olimpíadas

Foi lindo o encerramento da primeira Olimpíada na América do Sul e no Brasil. O que mais chamou a atenção e se viu nas redes sociais foi a foto da mandala de renda reproduzida no chão do estádio lotado de gente. Representativa do trabalho das artesãs rendeiras que produzem a fascinante Renda de Bilros, é um artesanato de tradição portuguesa presente em quase todas as Regiões do Brasil. Aqui, na Região Sul, em Florianópolis (SC), no ano de 2011, pesquisadores do Centro de Referência da Renda de Bilros começaram a contagem das rendeiras e conseguiram produzir 250 cadastros, que devem estar arquivados na Fundação Franklin Cascaes.

Mas, nem tudo são flores rendadas, bordadas, costuradas, entalhadas, pintadas, etc. na vida dos artesãos e artesãs brasileiras por aqui, nem nas Olimpíadas, nem nos eventos promovidos com o apoio dos governos federal, estadual e municipal. Só para se ter uma ideia do tamanho do problema no Rio de Janeiro, apesar da recente inauguração pelo SEBRAE do CRAB – Centro de Referencia ao Artesanato Brasileiro, que fica na Praça Tiradentes (tudo organizado a comando do PAB – Programa do Artesanato Brasileiro que, nos termos do Decreto nº 8.001, de 10 de maio de 2013, promove o desenvolvimento de políticas públicas de apoio ao Artesanato através da Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República – SMPE/PR) para as Olimpíadas o PAB aprovou apenas a exposição de artesanato na “Casa Brasil”. Ou seja, não houve um local destinado a exposição e comercialização de artesanato pelos próprios artesãos e artesãs junto ao público que foi assistir às Olimpíadas em seus diversos locais de realização, desde a festa de abertura ou de encerramento até mesmo nos diversos endereços das inúmeras competições que aconteceram sempre com recorde de público.

No Rio de Janeiro, o SEBRAE até convidou artesãos e artesãs a levarem seus trabalhos em consignação para comercialização em stands dentro dos shoppings em várias regiões do município, e o Sindicato dos Artesãos no Rio também chegou a solicitar ao prefeito espaços para realização de feiras na cidade, mas não foi atendido. Isto, com a justificativa de que o PAB já teria recebido o espaço destinado à categoria e as feiras seriam realizadas pela Economia Solidária. Entretanto, parece que o pessoal da Economia Solidaria carioca solicitou espaços de exposição e comercialização em praças que iriam utilizar apenas um único dia da semana, só que o alvará expedido era válido para a mesma praça, como se ela fosse ocupada por eles durante todo mês olímpico.

Ou seja, aqui ou acolá a confusão é a de sempre: entre os tantos encontros e desencontros dos indivíduos ou grupos envolvidos no Artesanato, estão as boas politicas públicas golpeadas em ritmo de extinção e as novas mal e mal construídas ou por realizar. O que pode ser que influencie daqui para frente a nossa capacidade de nos identificar ou de compreender a nossa própria riqueza cultural representada no Artesanato. Isto, com reflexos significativos no modo como pensamos e agimos em relação à utilização dos espaços públicos gratuitos para exposição e comercialização dos trabalhos dos nossos artesãos e artesãs, para que eles possam verdadeiramente produzir outro tipo de renda (a que provê o próprio sustento com a profissão escolhida), para além da Renda de Bilros.

 

Marcia Morales Salis - Arquivo Pessoal

 


Marcia Morales

Moradora do bairro Ipanema, Gestora Cultural e
Delegada pelo RGS no Colegiado Setorial Artesanato do CNPC-MinC

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